domingo, 7 de agosto de 2011

A comunhão dos Santos


"Comunhão dos Santos" (Koinonía ton hagíon) é uma expressão antiga da literatura cristã, que pode ser entendida de duas maneiras:

1) Comunhão ou solidariedade entre todos os fiéis.
2) Comunhão com as coisas santas ou com o tesouro dos méritos de Cristo, que são aplicados aos fiéis pelos sacramentos.

Ambas as significações estão corretas, mas a primeira decorre da segunda. Isto é, existe, primeiramente, a comunhão de cada cristão com os méritos de Cristo e o tesouro da Igreja, e, em consequência, há a comunhão ou solidariedade mútua daqueles que comungam com tal tesouro. Somos vasos comunicadores, de modo que quem é rico da graça divina, faz com que ela transborde sobre os irmãos; todavia quem se empobrece de bens espirituais, empobrece também a comunidade da Igreja ou mesmo toda a humanidade. Vejamos cada qual dessas duas modalidades de comunhão: a dos bens espirituais e a das pessoas vinculadas entre si por esses bens espirituais.

1 Comunhão de bens espirituais

Os bens espirituais de que participam todos os fiéis, são os méritos de Cristo, que nos são comunicados pelos sacramentos e a graça sacramental. Ensina o Catecismo Romano: "O fruto de todos os sacramentos pertence a todos os fiéis. Com efeito, os sacramentos, principalmente o Batismo, que é a porta pela qual se entra na Igreja, são igualmente vínculos sagrados que os unem a todos e os incorporam a Jesus Cristo. A comunhão dos Santos e a comunhão efetuada pelos sacramentos... Mais do que a qualquer outro, o nome de comunhão convém a Eucaristia, porque é principalmente ela que consuma esta comunhão" (01.10.24).

Diz a constituição Lumen Gentium no nº26, que o ministério da Ceia do Senhor é celebrado "para que, por meio da Carne e do Sangue do Senhor, se estreitem, num só corpo, todos os irmãos".

Os méritos de Cristo frutificam também nos carismas. Estes são dons especiais concedidos pelo Senhor para o serviço e a edificação da comunidade. Há os carismas ordinários (o dom de tratar bem os enfermos, o de saber educar corretamente, o de transmitir eficazmente a palavra de Deus, o de administrar ou liderar sabiamente...) e os carismas extraordinários (glossolalia, profecia, curas...). A comunhão com as coisas santas faz a comunhão com as pessoas santas.

2 Comunhão com as Pessoas Santas

Comungando com Cristo, os cristãos comungam entre si. Esta comunhão abarca, em estreita solidariedade, os cristãos militantes na Terra uns com os outros, os cristãos peregrinos neste mundo e os que já partiram, quer estejam glorificados no céu, quer ainda estejam na expectativa do céu chamada purgatório.

 2.1 Os cristãos peregrinos em mútua comunhão

Existe estupenda solidariedade entre os fiéis de Cristo uns com os outros e com os demais homens. O Papa João Paulo II a lembra na sua Exortação Apostólica "Reconciliação e Penitência":  "A solidariedade, em nível religioso, se desenvolve no profundo e magnífico mistério da Comunhão dos Santos, graças à qual se pode dizer que cada alma que se eleva, eleva o mundo inteiro. A esta lei de elevação corresponde infelizmente a lei da descida, de modo que se pode falar de uma comunhão no pecado, em razão da qual uma alma que se rebaixa pelo pecado arrasta consigo a Igreja e, de certa maneira, o mundo inteiro. Por outras palavras, não há nenhum pecado, mesmo o mais intímo e secreto, o mais estritamente individual, que diga respeito exclusivamente àquele que o comete. Todo pecado repercute, com maior ou menor veemência, com maior ou menor dano, em toda estrutura eclesial e em toda família humana" (n 16).

O Papa Pio XII já formulara tal doutrina na seguinte passagem da encíclica Mystici Corporis: "No corpo místico de Cristo nada de bem, mada de justo é realizado por algum dos membros que, pela Comunhão dos Santos, não transborde para a salvação de todos...Ao morrer na cruz, Cristo comunicou a sua Igreja, sem colaboração de parte desta, o tesouro ilimitado da Redenção. Quando se trata de distribuir este tesouro, não somente Ele compartilha com sua Esposa Imaculada a obra de santificação das almas, mas ele quer também que essa santificação brote da colaboração da Igreja. Mistério certamente tremendo, que jamais meditaremos suficientemente: a salvação de um grande número de almas depende das orações e das mortificações voluntárias, suportadas com finalidade apostólica, dos membros do Corpo Místico".

O antigo testamento já oferecia exemplos de intercessão: assim, Abraão rezou por Sodoma e Gomorra ( Gn 18,23-31), Moisés orou pelo povo rebelde (Ex 32,11-14), Jeremias pela sua gente infiel (Jr 18,20), no Novo Testamento ocorrem semelhantes casos: Rm 1,9; Ef 6,18-20; Tg 5,16.

Na história da Igreja existem belos testemunhos de cristãos que atribuiram graças recebidas do senhor à intercessão ou à vida santa de outros cristãos, ainda que totalmente desconhecidos: Santa Terezinha de Lisieux escrevia: "Veremos tantas coisas mais tarde! De vez em quando acho que sou talvez o fruto dos desejos de uma alma pequenina, à qual deverie tudo o que possuo" (Conseils et Souvenirs). "Muitas vezes, sem o saber, as graças e as luzes que recebemos, são devidas a uma alma escondida, porque o bom Deus quer que os Santos comuniquem, uns com os outros, as graças, mediante a oração".

Léon Bloy, eminente escritor Católico francês, dizia: "Tal impulso da graça que me salva de grave perigo, pode ter sido provocado por tal ato de amor efetuado na manha de hoje ou há quinhentos anos atrás por uma pessoa muito modesta, cuja alma correspondia misteriosamente a minha, e que assim foi recompensada" (Méditation d´un solitaire).

É de notar que também aqueles que vivem em pecado não somente podem ser beneficiados pelas orações de seus irmãos, mas podem também beneficiar seu próximo. Desde que rezem com reta intenção, podem colaborar para a salvação alheia, pois, como ensina São Tomás de Aquino, qualquer pecador que ore por seu irmão, é poderoso para obter o que ele pede em virtude de sua fé; cf Suma Teológica II/II, qu. 83, art. 16; qu. 178, art. 2, ad 1.

2.2. Os cristãos peregrinos na Terra e os justos falecidos

A morte não interrompe a comunhão existente entre os seres humanos, especialmente entre aqueles que pertencem ao Corpo Místico de cristo. O Senhor Deus, autor dessa comunhão, faz com que os justos no céu e no purgatório conheçam nossas preces e, em consequência possam oram por nós. Não há comunicação direta entre o aquém e o além, mas Deus a propicia providencialmente.

Disto se segue, que é possível nossa oração aos irmãos que estão na glória do céu, não para que nos dêem graças (Deus é a única fonte de todas as graças), mas para que intercedam por nós, obtendo-nos as graças de que necessitamos. A convicção desta verdade já era presente aos judeus do Antigo Testamento; veja-se o texto de 2Mc 15,12-14: Judas Macabeu teve a visão de Onias, Sumo Sacerdote, e Jeremias profeta, ambos falecidos, que oravam pelo povo de Deus, posto em luta contra os sírios pagãos.

A tradição cristã apresenta numerosos testemunhos de pessoas santas que, ao partir deste mundo, asseguravam aos sobreviventes a sua solícita intercessão. Assim dizia Santa Terezinha: "Se o bom Deus ouvir os meus desejos, meu céu se passará na Terra até o fim do mundo. Sim, quero passar meu céu e fazer o bem sobre a Terra. Isto não é impossível, visto que, no próprio seio da visão beatífica, os anjos velam por nós. Quando o anjo disser: 'Não existe mais tempo! ' (Ap 10,6), então repousarei; poderei gozar, porque o número dos eleitos estará completo...Meu coração exulta com este pensamento" (Verba).

Também com os irmãos que estão a se purificar, antes de entrar na glória celeste, depois desta vida, continua a nossa solidariedade. Esta crença também era familiar aos judeus do Antigo Testamento, pois rezavam em sufrágio aos mortos, como atesta 2Mc 12,42-46.

Pergunta-se: podem as almas do purgatório rezar pelos peregrinos na terra?

- São Tomás de Aquino e os teólogos, até o século passado, respondiam negativamente, alegando que as almas do purgatório é que precisam de nossas orações; nós devemos recorrer aos Santos do Céu, e não a elas; Cf S. Teológica II/II, qu.83, art.11, ad 3.

No século passado, porém, aconteceu algo que permite responder afirmativamente: O Papa Leão XIII, aos 14/12/1889 aprovou uma oração que pede às almas do purgatório que roguem pelo Papa, pela exaltação da Santa Igreja e pela paz das nações. O Concílio Vaticano II quis abster-se de tocar no assunto.

Podemos, pois, dirigir-nos às almas do purgatório, mas não esqueçamos que elas mais precisam de nossas preces do que nós precisamos das orações delas; temos os Santos da glória celeste como intercessores qualificados.

Texto extraído do livro " Católicos perguntam"  4º Edição.
                                           Estêvão Tavares Bettencourt, OSB


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